24/06/2017

O meu Pedrógão é Grande

Sou de Pedrógão Grande. Normalmente tenho que explicar bem onde é para as pessoas saberem mais ou menos de onde sou. Deixou de ser necessário. Quando digo de onde sou, os queixos caem de espanto e horror. No passado sábado comecei a acompanhar o incêndio ao final do dia, quando soube da sua existência. Não dormi nessa noite e no dia seguinte liguei para o trabalho, expliquei a situação e eu e o Carlos entrámos no carro em direcção à minha casa. Fui barrada em três estradas diferentes na zona de Ferreira do Zêzere mas consegui entrar na aldeia.
Eram 15h mas lá era noite cerrada. Os meus pais tinham deixado a casa para trás e estavam num cafézinho da zona com o resto dos habitantes daquela rua principal. Não conseguia ver a minha casa no meio do fumo e chamas, mas consegui perceber que grande parte do nosso terreno estava a ser consumido por um fogo que parecia vivo. Estava certa que a minha casa também ia ser destruída.

Pedrógão

Os bombeiros não estavam nem perto. Na altura doeu-me, mas de modo racional consegui entender que eram poucos para a quantidade de emergências. Conseguimos pedir ajuda através de amigas (obrigada, Marta e Carolina) e pouco depois apareceu um jipe de sapadores. Deram a nossa casa como zona "segura". Deixei os meus pais na segurança do café e subimos armados de panos molhados à volta da cara e um extintor de 6kg (prenda do meu pai há uns meses). 
O Carlos salvou imediatamente a parte traseira da minha casa de pegar fogo, porque ele vinha rasteiro mas com força na direcção da casa. O meu pai tinha enchido bidões de água antes da luz faltar e a bomba de puxar água deixar de funcionar. Com baldes começámos a apagar focos de incêndio à nossa volta. Foi quando nos apercebemos que o telhado do barracão dos animais estava em chamas. Gastámos dezenas de litros mas controlámos esse fogo e os animais salvaram-se todos.

Pedrógão
A minha casa está ali no meio.

Durante horas lutámos contra o vento, o fogo, o calor. Os bombeiros apareceram para o rescaldo e controlo. Mesmo assim agradeço a sua presença. Mas o Carlos, eu, os meus primos e várias pessoas com tractores e bidões salvámos casas e animais. 
O fogo continuou a comer pinheiros, barracões e vegetação na direcção do rio. Mas na nossa zona não havia mais nada para arder. Ninguém se magoou ou morreu por milagre. E eu estava aliviada pela segurança dos meus pais, família e gente da terra. A noite foi de vigilância e os dois dias seguintes também. De rescaldo e ajuda pontual dos bombeiros. A EDP foi célere após a minha chamada e na terça ao final do dia os meus pais já tinham luz em casa (e água, consequentemente).
O meu coração dói cada vez que penso nas pessoas que morreram. Conhecia algumas. E dói-me pelas pessoas, pela terra, pela natureza. São precisas medidas de prevenção para os fogos florestais. E esse trabalho é feito no inverno. Será que este número de mortes vai servir para abrir os olhos dos que podem fazer algo? Porque não deveria ser preciso morrer ninguém. Ninguém.

Numa nota final, a ajuda que surgiu de toda a parte do país e não só emociona-me até às lágrimas. Camiões de comida, de bens essenciais, de comida para os animais chegam todos os dias ao meu concelho e aos nossos vizinhos. A minha mãe levou de colegas de Pombal o carro cheio de donativos de roupa e comida. Eu própria disse que ela podia tirar tudo do meu armário do quarto e doar. Sei que vai custar mas o verde vai voltar a florescer e as pessoas vão reerguer-se das cinzas. Porque é uma terra de gente rija.

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